Poema de Natal Para isso fomos feitos: Vinícius de Moraes
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
quarta-feira, dezembro 23, 2009
Um Natal de muita paz
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Feliz Natal
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Séries: le cume des jours
segunda-feira, dezembro 21, 2009
Again
Archive, Again
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Séries: I-pod, le cume des jours
domingo, dezembro 20, 2009
Technology
Carl Craig & Les siècles Orchestra, Technology
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Séries: I-pod
terça-feira, dezembro 01, 2009
sublinhado (75)
Posso dizer que foi um dos livros mais arrebatadores que li nos últimos anos. Uma completa e emocionante surpresa. Entra para o lote dos livros que falam intimamente como se estivessem a descobrir os nossos próprios segredos.
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Séries: sublinhado
We can all be free, maybe not with words
Cat Power, Maybe Not
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Séries: I-pod
sábado, novembro 28, 2009
sublinhado (74)
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Séries: sublinhado
sexta-feira, novembro 27, 2009
sublinhado (73)
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Séries: sublinhado
sexta-feira, outubro 23, 2009
Porque não haverá paz para aquele que ama
lugar II
Há sempre uma noite terrível para quem se despede
do esquecimento. Para quem sai,
ainda louco de sono, do meio
do silêncio. Uma noite
ingénua para quem canta.
Deslocada e abandonada noite onde o fogo se instalou
que varre as pedras da cabeça.
Que mexe na língua a cinza desprendida.
E alguém me pede: canta.
Alguém diz, tocando-me com seu livre delírio:
canta até te mudares em cão azul,
ou estrela electrocutada, ou em homem
nocturno. Eu penso
também que cantaria para além das portas até
raízes de chuva onde peixes
cor de vinho se alimentam
de raios, seixos límpidos.
Até à manhã orçando
pedúnculos e gotas ou teias que balançam
contra o hálito.
Até à noite que retumba sobre as pedreiras.
Canta - dizem em mim - até ficares
como um dia órfão contornado
por todos os estremecimentos.
E eu cantarei transformando-me em campo
de cinza transtornada.
Em dedicatória sangrenta.
Há em cada instante uma noite sacrificada
ao pavor e à alegria.
Embatente com suas morosas trevas.
Desde o princípio, uma onde que se abre
no corpo, degraus e degraus de uma onda.
E alaga as mãos que brilham e brilham.
Digo que amaria o interior da minha canção,
seus tubos de som quente e soturno.
Há uma roda de dedos no ar.
A língua flamejante.
Noite, uma inextinguível
inexprimível
noite. Uma noite máxima pelo pensamento.
Pela voz entre as águas tão verdes do sono.
Antiguidade que se transfigura, ladeada
por gestos ocupados no lume.
Pedem tanto a quem ama: pedem
o amor. Ainda pedem
a solidão e a loucura.
Dizem: dá-nos a tua canção que sai da sombra fria.
E eles querem dizer: tu darás a tua existência
ardida, a pura mortalidade.
Às mulheres amadas darei as pedras voantes,
uma a uma, os pára-
-raios abertíssimos da voz.
As raízes afogadas do nascimento. Darei o sono
onde um copo fala
fusiforme
batido pelos dedos. Pedem tudo aquilo em que respiro.
Dá-nos tua ardente e sombria transformação.
E eu darei cada uma das minhas semanas transparentes,
lentamente uma sobre a outra.
Quando se esclarecem as portas que rodam
para o lugar da noite tremendamente
clara. Noite de uma voz
humana. De uma acumulação
atrasada e sufocante.
Há sempre sempre uma ilusão abismada
numa noite, numa vida. Uma ilusão sobre o sono debaixo
do cruzamento do fogo.
Prodígio para as vozes de uma vida repentina.
E se aquele que ama dorme, as mulheres que ele ama
sentam-se e dizem:
ama-nos. E ele ama-as.
Desaperta uma veia, começa a delirar, vê
dentro de água os grandes pássaros e o céu habitado
pela vida quimérica das pedras.
Vê que os jasmins gritam nos galhos das chamas.
Ele arranca os dedos armados pelo fogo
e oferece-os à noite fabulosa.
Ilumina de tantos dedos
a cândida variedade das mulheres amadas.
E se ele acorda, então dizem-lhe
que durma e sonhe.
E ele morre e passa de um dia para outro.
Inspira os dias, leva os dias
para o meio da eternidade, e Deus ajuda
a amarga beleza desses dias.
Até que Deus é destruído pelo extremo exercício
da beleza.
Porque não haverá paz para aquele que ama.
Seu ofício é incendiar povoações, roubar
e matar,
e alegrar o mundo, e aterrorizar,
e queimar os lugares reticentes deste mundo.
Deve apagar todas as luzes da terra e, no meio
da noite aparecente,
votar a vida à interna fonte dos povos.
Deve instaurar o corpo e subi-lo,
lanço a lanço,
cantando leve e profundo.
Com as feridas.
Com todas as flores hipnotizadas.
Deve ser aéreo e implacável.
Sobre o sono envolvida pelas gotas
abaladas, no meio de espinhos, arrastando as primitivas
pedras. Sobre o interior
da respiração com sua massa
de apagadas estrelas. Noite alargada
e terrível terrível noite para uma voz
se libertar. Para uma voz dura,
uma voz somente. Uma vida expansiva e refluída.
Se pedem: canta, ele deve transformar-se no som.
E se as mulheres colocam os dedos sobre
a sua boca e dizem que seja como um violino penetrante,
ele não deve ser como o maior violino.
Ele será o único único violino
Porque nele começará a música dos violinos gerais
e acabará a inovação cantada.
Porque aquele que ama nasce e morre.
Vive nele o fim espalhado da terra.
Herberto Helder
Lugar (poema II)
Poesia Toda
Assírio & Alvim
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Séries: poemas
sábado, outubro 17, 2009
sublinhado (72)
in Jakob von Gunten, um diário (Relógio d'Água), Robert Walser
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Séries: sublinhado
quarta-feira, setembro 16, 2009
Confessionário
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Séries: confessionário
terça-feira, setembro 08, 2009
Um bocadinho de ufanismo...
Agência Brasil
Publicação: 07/09/2009 18:46
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terça-feira, agosto 18, 2009
É bom saber...
The Good, the Bad and the Queen
Ontem fizeram-me ouvir pela primeira vez The Good, the Bad and the Queen. É bom saber que o Damon Albarn continua por aí... e a fazer coisas destas....
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Séries: I-pod
uma barragem a 300 km....
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Séries: le cume des jours
sexta-feira, julho 31, 2009
foi em 2007
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Séries: le cume des jours
terça-feira, junho 30, 2009
Obituário
Não dava para ficar calada a respeito do circo midiático criado ao redor do cantor. Bastou morrer para que ele deixasse de ser um pedófilo para ocupar novamente seu papel de gênio, Rei do pop.
Não entendo o motivo de as pessoas se surpreenderem com a morte misteriosa daquele que foi a personificação do mistério no mundo pop. Mais do que surpresas, as pessoas estão chocadas.
Chocadas com o que, me pergunto. O que ainda pode provocar estranheza, estupefação, no que tange à figura de Jackson?
Chocada fiquei quando vi um Michael Jackson se dissolver como ser humano; quando vi sua esquizofrenia e infelicidade ganharem corpo, abrindo mão daquilo que mais nos representa: a identidade.
Michael Jackson não é o primeiro e está longe de ser o último na lista de celebridades que desaparecem de maneira trágica e triste.
A dependência química, a depressão, a falta de limites, aliadas a uma história de vida miserável, já levaram muitas pessoas do cenário musical: Cássia Eller, Renato Russo, Elis Regina, Janis Joplin, Billie Holyday, Jim Morrison, Jimi Hendrix, Brian Jones, Kurt Cobain, Michael Hutchence, Elvis Presley e por aí vai.
O que diferencia Michael Jackson da pequena lista acima é o fato de ter sido o único (se bem me lembro) que – além de causar mal a si mesmo pelo uso de drogas – mutilou suas feições.
Nem vou me prolongar, neste post, discorrendo sobre o talento inconteste de MJ. Na minha opinião, somente dois nomes citados acima revolucionaram a música dentro de seus estilos.
Elvis Presley e M. Jackson. As alcunhas de Rei do rock e Rei do pop, respectivamente, fazem jus aos artistas. Ambos fizeram mais do que revolucionar o rock e o pop. Eles criaram estilos únicos. Elvis deixou o legado do macacão espalhafatoso e do requebrado hormonal de sua pélvis; Michael abusou de coreografias ousadas e das luvas bordadas com pedras preciosas. Independentemente do gosto do freguês, isso ficará. Essas expressões têm assinatura inconfundível.
O que me deixa cada vez mais desesperançada em relação ao ser humano é, de um lado, a sua fragilidade, a sua debilidade enquanto indivíduo; de outro, sua ferocidade enquanto sociedade. Podemos ser fator de transformação, mas escolhemos ser letais, hobbesianos.
Além da baixíssima autoestima, de uma história pessoal de abusos, Michael Jackson foi vítima de preconceito racial. Ele acreditou, como poucos, numa teoria do branqueamento e não mediu esforços para ser aceito.
Aqui no Brasil, a teoria foi estudada por Sérgio Buarque de Holanda; foi tema de livros, como os de Lima Barreto (O mulato, Clara dos Anjos), e ainda hoje é estudada nos meios acadêmicos.
Skidimore em Preto no branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro, afirma que embora o campo intelectual brasileiro, do final do XIX e início do XX, se inspirasse nas teorias racistas européia e norteamericana, não podia negar o alto grau de miscigenação do povo brasileiro e nem pregar uma segregação institucionalizada como fizeram os EUA. “Ao contrário dos EUA, em vez de duas castas (branca e não branca), havia uma terceira casta social bem reconhecida: o mulato. Quanto mais clara a tonalidade da pele, maior sua aceitação na ascensão social.
Daniel Bar-Tal, um dos pioneiros na análise da infra-humanização dos grupos minoritários, afirma:
“Dehumanization involves categorizing a group as inhuman either by using categories of subhuman creatures such as inferior races and animals, or by using categories of negatively valued superhuman creatures such demons, monsters, and satans. Trait characterization is done by using traits that are evaluated as extremely negative and unacceptable to a given society”.
Michael Jackson mais do que um fenômeno de mídia, merece estudo antropológico, sociológico e psicológico. Pode ser um rico objeto de estudo. Mas prefiro pensar que alguém como ele merece também atenção dos nossos olhos humanos, ou do que restou de humanidade em nós, para enxergarmos quão poderosos são nosso julgamento, nossas palavras e a nossa falta de afeto.
Já disse isso uma vez aqui mesmo. Repito: a tolerância não me convém. Não quero tolerar nem ser tolerada. Quero ser digna de respeito.
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Séries: in memoriam
domingo, junho 14, 2009
ASVS | Arquitectura + Interiores + Galeria
O projecto empresarial desenvolvido aborda um conceito de atelier cuja actividade se estende para além da oferta de serviços de arquitectura. A ASVS alarga o seu campo de acção ao design e à arte através da implementação de um show-room de interiores e de uma galeria de arte nas suas instalações.
Paralelamente à actividade primordial, a ASVS desenvolve um projecto de dinamização cultural integrado na dinâmica criativa do atelier e da galeria de arte. O projecto surge como resposta à necessidade de estabelecer uma plataforma de debate que incentive a discussão de teorias, conceitos e ideias relativos às questões contemporâneas da arquitectura e urbanismo, do design e das artes plásticas.
ASVS ARQUITECTURA
Prestação de serviços de Arquitectura, Urbanismo e Interiores.
ASVS INTERIORES
Galeria comercial de artigos de mobiliário, decoração, iluminação, têxteis-lar e livros relacionados com a Arquitectura, Arte e Design;
ASVS GALERIA
Galeria de arte e projecto de dinamização cultural no domínio da Arquitectura, Fotografia, Design e Artes Plásticas pela realização de exposições, tertúlias e eventos.
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Séries: info
sábado, maio 02, 2009
Confessionário (54)
Esse texto foi publicado há 9 anos atrás na Revista Continente. Hoje eu o reproduzo aqui neste espaço porque tem tudo a ver com o Sincronicidade e com a nossa condição.
Li e sorri comigo mesma, lembrando desse nosso confessionário, desse espaço de intimidade singular que criamos e mantemos apesar do silêncio, da distância e da falta de convivência física... é, há toda sorte dessa coisa chamada casamento.
Saudade tua.
Beijo,
Tua Lu.
As pessoas difamam o casamento quase que diariamente. Aliás, este hábito é tão comum aos jovens de um modo geral quanto aos que casaram há cinco anos. Em seu discurso, dizem que o amor mingüa, que o sexo começa a rarear, que a rotina é sufocante, repetem o “onde esteve?”, “que horas são essas?”, e outros comentários acabrunhantes... Dizem, dizem, reclamam, mas seguem casando-se e mantendo-se casadas por anos. Qual é a boa dessa história? Que há de tão interessante para manterem-se casados? Uma jóia chamada intimidade.
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Séries: confessionário
quarta-feira, abril 08, 2009
XX ou uma mutação genética?
MIAMI (Reuters) - Um "lugar relaxante, calmo, lindo" pode não ser a descrição de todos para a Baía de Guantánamo, em Cuba, onde os Estados Unidos mantêm cerca de 240 prisioneiros em um centro de detenção que recebeu críticas do mundo todo.
Mas esta foi a opinião da atual Miss Universo, Dayana Mendoza, da Venezuela, que visitou a base naval norte-americana no leste cubano este mês em uma viagem programada por uma organização que presta auxílio às tropas dos EUA. A base de Guantánamo, cuja existência tem sido contestada pelo governo cubano por anos, é usada por autoridades norte-americana como um campo de prisão para suspeitos de terrorismo estrangeiros. Críticos condenam a base como um símbolo de abuso na guerra contra o terrorismo, lançada por Washington após os ataques de 11 de setembro de 2001. Mendoza, de 22 anos, que esteve na unidade entre os dias 20 e 25 de março, acompanhada pela Miss Estados Unidos, Crystle Stewart, de 27 anos, ficou entusiasmada com sua visita a Guantánamo, classificando-a como uma "experiência incrível" em um texto escrito no blog do site do Miss Universo na Internet, em 27 de março.
"Foi muuuuito divertido!", afirmou Mendoza, descrevendo como ela e Stewart se encontraram com militares norte-americanos e deram voltas pelo campo, protegido com cercas de arame farpado, minas terrestres e torres de observação.
Ela disse ter visitado também um bar na base e uma "inacreditável" praia. "Visitamos os campos de detentos e vimos as celas, onde eles tomam banho, como eles se divertem com filmes, aulas de arte, livros.
Foi bem interessante", escreveu. "Não queria ir embora, era um lugar tão relaxante, tão calmo e lindo", acrescentou. Ex-detentos e grupos de direitos humanos acusam o uso de tortura, incluindo a simulação de afogamento e outros abusos físicos, na prisão de Guantánamo.
(Reportagem de Pascal Fletcher)
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terça-feira, março 10, 2009
Os bestializados
Sempre imaginei quais demônios o atormentavam naquele momento em que os expulsou das entranhas ao soltar a voz. Qual dor ficou tão insustentável a ponto de se transformar em loucura?
A violência é hoje o meu maior demônio. Aquele que quero expelir de forma incisiva, aquele que não aguento mais esconder ou fingir que não existe. A violência extrapola os muros do que é considerado real – os jornais, as revistas, o noticiário de TV – e da própria historiografia. A violência está identificada na música, nas expressões artísticas e naquilo que é considerado fictício: cinema e literatura. Guernica, holocaustos, Meninos não choram, Milk, 174, Proibido Proibir, Cidade de Deus... a lista é extensa.
O que leva um pai, tio, padrasto – pessoas com o dever de proteger e cuidar – cometer tantas atrocidades contra suas crianças?
Já não sei mais diferenciar o que é doença e o que é simplesmente maldade. Porque se supõe que a pedofilia, por ser uma doença, representaria casos isolados que se mantem mais ou menos constantes nas estatísticas. Mas não é o que acontece. Muito pelo contrário, o quadro é desolador. Crescem os casos de abuso e violência. Vivemos uma quimera de que a era digital, tecnológica, o conhecimento ao alcance de mão, para ser mais exato, em um simples clique aprimorasse o intelecto e a consciência. Falácia! Estamos a cada dia mais bestializados.
Uma criança de 9 anos acabou de passar por um duplo trauma. Não bastasse ser violentada desde os 6 anos de idade, essa menina também foi submetida a um aborto. Que tipo de criatura é essa que além de destruir um corpo tão frágil ainda destrói a doçura e o sonho de uma criança? Ainda restou alguma esperança nela? Qual a noção de proteção que ela tem? Que tipo das relações ela construirá? Terá sobrado algum espaço para o afeto e a confiança?
Não bastasse o absurdo de tudo, ainda vem a Igreja com uma conversa sem pé nem cabeça sobre excomunhão!
Sou contra o aborto, mas sou ainda mais contra a estupidez. Que tipo de moral norteia uma conduta em que se excomunga a vítima e o algoz sai ileso?!
Mulheres, mães, acordem, por favor! Pesa sobre nós a responsabilidade de educar os filhos. Que tipo de pessoas estamos formando e lançando no mundo? Sempre me pareceu um disparate, um paradoxo, termos na sociedade contemporânea pensamentos machistas ainda tão profundamente arraigados. Qual é a parcela de contribuição do universo feminino em perpetuar tanta burrice e preconceitos? O que estamos ensinando aos nossos filhos? Ainda dizemos aos meninos que existem dois tipos de mulheres, as que servem para casar e as que não servem? Ainda usamos o velho argumento para as meninas que os irmãos podem fazer isso e aquilo pelo simples fato de serem homens? Que o homem promíscuo é um garanhão e a mulher é puta? Que eles podem dispor do nosso sexo como se fossem deles? No dia 8 de março, as mulheres bradam por liberdade e igualdade nas suas mais diferentes expressões, mas será que em casa ensinamos isso aos seus filhos? Será que ainda estimulam os garotos a iniciarem cedo sua vida sexual enquanto pregam a virgindade das meninas como se sexo não fosse responsabilidade de duas pessoas?
Os homens são educados por mulheres. As mesmas mulheres que sofreram anos por causa da repressão e de tantos espartilhos a lhe comprimirem o corpo e alma. Não seriam por isso mesmo mais sensíveis para perceberem o menor sinal de asfixia? Onde estão essas mães que não enxergam seus filhos, que não percebem o terror nos seus olhos, os hematomas no corpo, a apatia no gesto? Foram três anos de abuso e para onde estavam voltados os olhos dessa mulher?
Não estou aqui indicando culpados. Não faz sentido. Mas faz sentido refletir nossos padrões de comportamento e valores. Estamos deixando um legado de infelicidade e destroços. Estamos criando gerações e gerações de farrapos humanos, de deficientes emocionais.
Já é difícil ter que conviver com a violência institucionalizada, aquela que vem da rua, da miséria, do tráfico, mas ninguém deve ser obrigado a viver a violência da casa, do espaço das relações privadas e dos afetos.
Não tenho muito o que celebrar nesse 8 de março. Pra dizer a verdade, por vezes, tenho vergonha de dizer que sou ser humano. Os irracionais somos nós.
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Séries: le cume des jours
quinta-feira, fevereiro 19, 2009
atirar os dados...
Revolution, The Beatles
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Séries: I-pod
segunda-feira, fevereiro 16, 2009
'a eternidade e um dia' (4)
Alexander está sentado numa poltrona. É acordado pela empregada, Urania, que lhe diz ‘Hoje é o último dia. Permita-me que o leve ao hospital.’ Alexander recusa e agradece-lhe a dedicação dos últimos três anos. Vai à varanda e observa a envolvente por alguns minutos. Coloca a trela no cão e sai de casa em direcção ao porto de Salónica. Enquanto passeia relembra o passado, o casamento feliz com a Anna já falecida. O dia é cinzento, a atmosfera carregada. Volta a casa, pega no carro e dirige-se ao centro da cidade. Ao parar num semáforo, um rapazinho de blusão amarelo aproxima-se com um limpa pára-brisas na mão à espera de uns trocados. O semáforo abre e de repente uma patrulha policial entra em perseguição do grupo de miúdos, prováveis refugiados Albaneses à procura de pão nas ruas da cidade. Alexander abre a porta do passageiro e grita ao rapazito de amarelo para que entre, livrando-o de ser apanhado pela polícia. Mais à frente, Alexander pára o carro e o rapaz despede-se com um sorriso generoso, grato por tê-lo afastado da confusão.
Dirige-se a casa da filha e pede-lhe que fique com o cão dizendo-lhe que vai de viagem durante algumas semanas. Despede-se levando o cão pela trela sem discutir, após a filha lhe ter negado o pedido e notificado que tinha vendido a casa de férias a uma construtora que iniciaria obras de demolição naquela tarde para a construção de um condomínio. Grande parte das memórias de Alexander, analepses que acontecem periodicamente ao longo do filme, sempre claras e plenas de luz em contraste com a lugubridade do dia da acção, estão intimamente ligadas a essa casa. As recordações de Anna, a infância da filha, a sua mãe, surgem quase sempre no mesmo cenário, como se aquela casa e todos os seus cantos fossem o suporte físico das emoções do escritor.
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Séries: a eternidade e um dia, Arquitectura, cinema, filosofia
alone in kyoto
Alone in Kyoto, Air
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Séries: I-pod
sexta-feira, fevereiro 13, 2009
'a eternidade e um dia' (3)
A Eternidade e um dia, Theo Angelopoulos
(continua)
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Séries: a eternidade e um dia, Arquitectura, cinema, filosofia
quinta-feira, fevereiro 05, 2009
'a eternidade e um dia' (2)
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Séries: a eternidade e um dia, Arquitectura, cinema, filosofia
quarta-feira, fevereiro 04, 2009
'a eternidade e um dia' (1)
Remetendo esta catadupa cinética para o nosso quotidiano constata-se exactamente o mesmo. Os acontecimentos, as acções, os diálogos, nascem e morrem ao ritmo dos segundos. No entanto, há um processo humano, e intrinsecamente humano, que parece contrariar todo o sentido natural das coisas – a construção das emoções e a forma como elas se vão sedimentando na memória. Há obrigatoriamente um processo de transitoriedade no construir emocional e na forma como ele é apreendido e recuperado por cada indivíduo. O que se viveu no passado não tem no presente o mesmo significado, nem o mesmo peso emotivo de outrora. A reciclagem acontece, mas parece haver um processo que, em certas alturas, bloqueia a engrenagem da máquina natural.
A história da arquitectura poderá ser um argumento interessante para explicar onde pretendo chegar. Parte-se do princípio que a Arquitectura (do grego arché - αρχή - significando "primeiro" ou "principal" e tékton - τέχνη - significando "construção") é a arte, ou a técnica, da criação do espaço organizado.
Introduzindo o conceito de que arquitectura é a organização do espaço com uma intenção específica para além da de protecção ou abrigo, qual será então a primeira obra arquitectónica?
(continua)
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Séries: a eternidade e um dia, Arquitectura, cinema, filosofia
terça-feira, fevereiro 03, 2009
Pygmalion
Ultimamente tenho escutado vezes sem conta uma das músicas do álbum Mythologies que a Patricia Barber apresentou nesse concerto. Chama-se Pygmalion. Na altura, juntamente com ‘If I Were Blue’, foi uma das canções que mais me tocou. Entrou-me no ouvido de um modo sensitivo, como qualquer coisa que nos toca a pele muito levemente. A melodia parecia-me tão íntima e limpa que os pormenores da composição e sobretudo o poema passaram completamente despercebidos. Hoje, quando a escuto, sinto no peso de cada palavra e de cada verso a profecia que na altura não soube compreender. O amor cega… no meu caso ensurdece.
Pygmalion, Patricia Barber
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Séries: I-pod, le cume des jours
quarta-feira, janeiro 28, 2009
falar pelo olhar de um cão
'Perro semihundido', 1819-1823, Museu do Prado, Madrid, Francisco Goya
Ninguém escapa às intermitências da vida. De modos mais ou menos hábeis contornamos sempre os acontecimentos por mais profundos e dolorosos que possam parecer.
Há meses que não sinto vontade de escrever. Pior! Há meses que não tenho nada para dizer. Tenho reflectido sobre a minha mudez… que verdade seja dita, não passa apenas pela escrita. É literalmente uma mudez verbal e social. A vida tirou-me o meu pai em Agosto. A minha avó em Janeiro. Silenciou-me. Calou-me. Emudeceu-me. Tudo o que me esforcei por acreditar durante anos ruiu. Deixou de fazer sentido. Não sei nada sobre a existência. Mas eu achava que sabia (!), este blogue é testemunho vivo das minhas presumíveis verdades.
Não é uma queixa ou um lamento que deixo neste texto. Não, não é nada disso! Não tolero os meus lamentos como não tolero os lamentos dos outros. Ganhei aversão a gente queixosa. Sinto pena e remorso de todas as situações em que me vesti de vítima. Chego a ter ódio à forma dramática como vivi alguns episódios da minha vida. Cortei relações com grande parte dos poetas. Acho-os insuportáveis. É ridícula a extravagância das palavras e mais ridícula a forma imponderada da sua utilização. Deviam sentir a dor de um martelo de chumbo a bater-lhes nos dedos antes de escreverem a mais inócua das vogais.
Garanto-vos, este texto não é um lamento. Também não é um grito. É pura e simplesmente um atestado de ignorância. A constatação de que nada sei sobre a condição humana. Nos escombros das minhas certezas existe apenas uma que me esforço por não deixar ruir – a certeza de que acredito no amor. Repito-o diariamente com toda a convicção. Se não o fizer, e usando palavras que não são minhas, ‘incorro no maior dos pecados’. Estaria, por opção, a sobreviver no lugar de viver. Talvez seja por isso que não sinto pecado no cão do Goya. Há uma candura naquele colocar de focinho que determina esperança, como se para lá do fogo e do breu existisse uma luz tão pura e tão verdadeira que proibi-la ou rejeitá-la não seria digno de perdão. O cão do Goya não me parece nada preocupado em perceber o sentido da vida, no entanto, o seu olhar, diz-me que sabe tudo.
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Séries: artes plásticas, imagens que se colam ao peito, le cume des jours
terça-feira, janeiro 13, 2009
Brasil...
Cajuína (Caetano Veloso), Cibelle
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Séries: I-pod
domingo, janeiro 11, 2009
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Séries: Post-it
sexta-feira, janeiro 09, 2009
Cínico Optimista
Hoje, e porque me lembrei que no Távora talvez encontrasse uma referência que necessitava, reli-o. No fim de o ler (para dentro) disse à Ana: ‘deixa lá ler-te isto’. E li-o novamente em voz alta. Após a leitura ficou um silêncio um pouco constrangedor no escritório. Perguntei-lhe…’que dizes disto?’. Ela respondeu… ‘é bíblico’… silêncio no escritório novamente. ‘Lê outra vez este parágrafo’ disse-me apontando-o no livro.
Sobre a posição do arquitecto
Tal como é, tal o homem organiza o seu espaço; a um indivíduo e a uma sociedade em equilíbrio correspondem um espaço harmónico; a um indivíduo e a uma sociedade em desequilíbrio corresponde a desarmonia do espaço organizado. A forma criada pelo homem é prolongamento dele - com as suas qualidades e com os seus defeitos.
Todo o homem cria formas, todo o homem organiza o espaço e se as formas são condicionadas pela circunstância, elas criam igualmente circunstância, ou ainda, a organização do espaço sendo condicionada é também condicionante.
O arquitecto, pela sua profissão, é por excelência um criador de formas, um organizador do espaço; mas as formas que cria, os espaços que organiza, mantendo relações com a circunstância, criam circunstância e havendo na acção do arquitecto possibilidade de escolher, possibilidade de selecção, há fatalmente drama.
Porque cria circunstância - positiva ou negativa - a sua acção pode ser benéfica ou maléfica e daí que as suas decisões não possam ser tomadas com leviandade ou em face de uma visão parcial dos problemas ou por atitude egoísta de pura e simples satisfação pessoal. Antes de arquitecto, o arquitecto é homem, e homem que utiliza a sua profissão como um instrumento em benefício dos outros homens, da sociedade a que pertence.
Porque é homem e porque a sua acção não é fatalmente determinada, ele deve procurar criar aquelas formas que melhor serviço possam prestar quer à sociedade quer ao seu semelhante, e para tal a sua acção implicará, para além do drama da escolha, um sentido, um alvo, um desejo permanente de servir.
Os seus campos de actividade são múltiplos - porque múltiplas são as facetas do espaço organizado. Projecta e realiza edifícios, dedica-se ao planeamento do território a escalas várias, desenha mobiliário.
Para ele, porém, projectar, planear, desenhar, devem significar apenas encontrar a forma justa, a forma correcta, a forma que realiza com eficiência e beleza a síntese entre o necessário e o possível, tendo em atenção que essa forma vai ter uma vida, vai constituir circunstância.
Sendo assim, projectar, planear, desenhar, não deverão traduzir-se para o arquitecto na criação de formas vazias de sentido, impostas por capricho da moda ou por capricho de qualquer outra natureza. As formas que ele criará deverão resultar, antes, de um equilíbrio sábio entre a sua visão pessoal e a circunstância que o envolve e para tanto deverá ele conhecê-la intensamente, tão intensamente que conhecer e ser se confundem.
E da circunstância deverá ele contrariar os aspectos negativos e valorizar os aspectos positivos, o que significa, afinal, educar e colaborar. E colaborará e educará também com a sua obra realizada.
A sua posição será, portanto, de permanente aluno e de permanente educador; como tal saberá ouvir, considerar, escolher - e também castigar.
Não se suponha ele o demiurgo, o único, o génio do espaço organizado - outros participam também na organização do espaço. Há que atendê-los e colaborar com eles na obra comum.
Para além da sua preparação especializada - e porque ele é homem antes de arquitecto - que ele procure conhecer não apenas os problemas dos seus mais directos colaboradores, mas os do homem em geral. Que a par de um intenso e necessário especialismo ele coloque um profundo e indispensável humanismo.
Que seja assim o arquitecto - homem entre os homens - organizador do espaço - criador de felicidade.
Da Organização do Espaço (FAUP Publicações), Fernando Távora
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Séries: Arquitectura, le cume des jours
é o que é
A única coisa que me ocorreu dizer-lhe foi que a vida é tal e qual uma peça de teatro. Existe o palco e existem os actores. Existe cena e cenário que se sucedem repetidamente. Existem todos os tipos de registo, do cómico ao trágico, do sádico ao hedonista. Os actores vão entrando e saindo de cena. Alguns deles persistem dumas para outras, avançam acto após acto, outros entram por segundos e saem imediatamente do quadro, mas só um permanece naquela peça em específico. Esse um sou eu, é ele, é cada um de nós na sua respectiva peça… até ao dia em que o electricista resolva apagar as luzes do palco e a acção passe a ser outra coisa qualquer que não cabe nesta metáfora.
Não há nostalgia, é pura e simplesmente a mecânica da vida.
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Séries: le cume des jours
life doesn't rime...
Dive, Andrea Gibson
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Séries: poemas
quarta-feira, janeiro 07, 2009
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Séries: Post-it
segunda-feira, janeiro 05, 2009
rirmo-nos uns dos outros
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Séries: artes plásticas, exposições