sexta-feira, setembro 14, 2007

A arte literária de Badida

Declarando seu amor primordial pela literatura, a pintora Badida constrói universos fantásticos que transpassam a tela e entram na sua vida.


*Por Mariana Oliveira

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Usualmente, os escritores são amantes da literatura, as atores da encenação teatral, os músicos da música, os pintores das artes plásticas. Mas o que dizer de uma pintora que se revela, antes de tudo, uma apaixonada pela literatura? Pois esse é o caso raro da pintora Marisa Moreira da Costa Campos, Badida, que tem uma devoção toda especial à literatura. E o que faz ela entre tintas e pincéis ao invés de rodear-se de papéis para escrever? Seu severo senso crítico não lhe permitiu, ainda, alçar vôo no ramo das letras, mas sua habilidade como pintora lhe deu a possibilidade de reinventar suas próprias histórias e as histórias dos outros.
Filha de Moreira Campos, um dos maiores escritores cearenses, Badida, também natural do Ceará, construiu sob a influência do pai seu apreço pelas artes literárias. Com tanta responsabilidade transferida por esse parentesco, ela até hoje não se sente à vontade para publicar seus escritos, que estão muito bem–guardados, em sua casa. “Eu costumo dizer que a minha grande paixão é a literatura, infelizmente meu vôo é rasteiro para escrever, mas para ler eu sou fascinada. Minha obra sempre esteve inspirada na literatura, que, para mim, é a arte maior, até porque eu tive um pai que era um grande escritor. Como eu não escrevo, é como se eu fizesse meus contos, minhas crônicas, através da pintura. Eu até já tentei desassociar, mas não consigo.”
Os últimos trabalhos de Badida têm inspiração declarada no trabalho do poeta e roteirista italiano Tonino Guerra, a quem a pintora foi apresentada por um documentário de TV. Desde então, ela implementou uma busca por alguma publicação do poeta. Demorou, mas uma amiga lhe presenteou com um exemplar de O Livro das Igrejas Abandonadas, editado em Portugal. As palavras do poeta italiano agora inspiram suas mais recentes obras, que devem fazer parte de uma exposição individual programada para novembro. Enquanto isso, quatro trabalhos dessa série podem ser vistos dentro da exposição "Delas por Elas", no espaço cultural da Le Lis Blanc, em Casa Forte, junto com obras de Guita Charifker, Maria Carmem e Marianne Peretti, com curadoria de Pedro Frederico.
Em paralelo às leituras de Tonino Guerra, Badida pinta ainda o poeta Ledo Ivo, sem esquecer suas lembranças junto ao “paizinho” e a “mãezinha”, ainda no Ceará. A sua única neta, Bárbara, é sempre ouvida pela avó, tanto que em uma das suas últimas exposições os quadros expostos foram titulados por Bárbara, antes mesmo de serem pintados.
Apesar dos rasgos surrealistas saltarem aos olhos, ela prefere definir-se como simbolista (apesar da diferença ser sutil), alegando que em suas obras há sempre, ao final, a moral da história. Perguntada sobre a pintura no mundo contemporâneo é categórica, afirmando que a pintura não morreu, não vai morrer, e que há espaço para todo mundo. “O problema da arte contemporânea, da arte conceitual, é que o conceito está vindo sem a obra”, explica, lembrando a história A roupa nova do rei, como uma metáfora da situação das artes na atualidade. “No lugar da obra está o conceito, o conceito dizia que a roupa era lindíssima, tudo bem, mas cadê a roupa? Aí a criança, um ser de pureza total, que ainda não se limitou na vida, diz: o rei está nu. Evidente que há grandes artistas conceituais, basta um Cildo Meireles, mas há muitos equívocos, na minha ótica.”
Pintando um quadro por vez e também lendo um livro por vez, Badida, que iniciou como uma diletante, vendeu todas as obras expostas na sua primeira exposição individual em Fortaleza, e conseguiu sobreviver através da arte, acredita que a felicidade do artista legítimo é expor. Este ano, por fim, depois de um longo período habitando a fronteira com o mundo da imaginação, Badida aterrissa outra vez no Recife (esquecendo seu pavor de voar, felizmente) para apresentar seu universo fantástico, criado e recriado através das suas fábulas e das fábulas dos outros.

* Mariana Oliveira é jornalista e editora da Continente Multicultural.

quinta-feira, setembro 13, 2007

FÉRIAS
*

até Outubro

quarta-feira, setembro 12, 2007

janelas abertas (5)

X. é uma mulher de 40 anos. Saiu de casa duas horas antes de entrar ao trabalho impecavelmente vestida como de resto é seu hábito. Não demora mais do que vinte minutos no trajecto e os colegas fartam-se de perguntar por que raio sai ela de casa tão cedo não tendo filhos para levar à escola e marido a quem dar o nó da gravata… X. esboça um sorriso e diz-lhes ‘quem me tira o prazer de um pequeno-almoço tranquilo na frescura da manhã, tira-me tudo’. Mas hoje bem poderia ter saído de casa quatro ou seis horas antes, visto nenhuma das bombas que tomou para adormecer ter surtido efeito.
X.
foi sempre motivo de orgulho para os pais. Nunca lhes causou qualquer embaraço, nem mesmo nas idades em que seria normal fazê-lo. Sempre a melhor aluna da escola, estudiosa e aplicada, filha amiga e companheira, profissional exímia, mulher generosa capaz de tudo pelos amigos, enfim, o desejo de qualquer casal… qualidades que, associadas a uma beleza fina e delicada e a um trato de uma simpatia só, faziam a mãe perguntar-se de onde na família teria sido ressuscitada tal combinação genética. Nunca foi necessário exigir-lhe nada, os seus actos nasciam antes de serem pedidos. Uma filha que nunca deu trabalho.
Sentou-se como sempre na mesa ao lado da janela e agradeceu num bom-dia cúmplice o café e o pão com manteiga que o senhor Y. prontamente preparou assim que viu X. apontar à porta. Enquanto o aroma do café lhe conquistava lentamente a boca o seu olhar perdia-se na luz da manhã. A cidade acordava lentamente. Do outro lado da rua, uma garotinha de 6 ou 7 anos caminhava de mochila às costas em direcção à escola. Deteve-se nela por um instante e uma lágrima de rímel desceu-lhe involuntariamente pelo rosto… murmurou: ‘minha querida, não exijas de ti mais que o coração ou nenhum se deitará contigo por amor’.

segunda-feira, setembro 10, 2007

sábado, setembro 08, 2007


da série 'Books', 'Dictionary', 1994, Abelardo Morell

Confessionário (49)

Meu querido Vítor,

Esse confessionário talvez fique um bocado confuso, sabe? É que antevejo o festival de fragmentos que vou esboçar para ti, sem, contudo, concluí-los por completo.
Quero começar dizendo que eu amei, simplesmente amei ser despertada por um telefonema teu. Quase pude tocar-te novamente num afetuoso abraço, como aquele abraço que guardo com tanto carinho no dia em que dissemos “até breve”, diante do Hotel.
A sensação fez-me lembrar – e com isso não quero reduzir o assunto, porque ele é demais complexo – que sentimos solidão quando nos isolamos da vida, forçada ou circunstancialmente, mas basta que estabeleçamos os laços para que o mal-estar de ser/estar só evapore. Continuo acreditando que o afeto nos salva de nós mesmos.
Quero que saibas que me sinto mais fortalecida, serena com o restabelecimento da minha sintonia. Lembras das bonequinhas russas, aquelas que foram tema de uma das correspondências entre A. e V., meu querido? Sinto que estou quase chegando à primeira boneca, à minha gênese. É só o primeiro passo, mas tem sido como tocar “os frutos rubros e selvagens” da minha existência. Espero que tudo isso faça um pouco de sentido para ti, porque para mim tem feito uma grande diferença.
Sobre silêncios... não, não ando passeando pela blogosfera, nem lusa nem brasileira. Ando um pouco farta de tudo isso... não sei te explicar, mas é sintomático que preciso de um tempo, de umas férias desse mundo, talvez por isso ando tão pouco presente.. Tenho avaliado a continuidade do Glossolalias e do Sincronicidade, sobre a relevância do que escrevo, penso, reflito... outro dia, eu reli um post teu sobre a importância desse nosso espaço a despeito de tudo que se espera de um blogue: visitas, participação, interação, interesse ou falta de...
Ambos são espaços muito distintos. Um representa uma possibilidade de ser ouvida, de ter e dar voz a uma persona pouco conhecida até pelos que convivem comigo; o outro representa a beleza de uma amizade, a concretização de uma confiança que eu pensava não ter mais lugar no nosso mundo apressado e plastificado. Estou te falando tudo isso para saber o que vai dentro de mim.
Ultimamente só ligo o computador para ver e-mails e fazer minhas pesquisas, nada mais.
Estou há dias para escrever sobre o Drummond, sobre a saudade que sinto desse poeta, da forma simples e direta que tinha de dizer as “verdades” da alma. Há 20 anos perdemos Drummond e era sobre isso que queria falar, mas não consigo verbalizar. Não queria publicar nada “acadêmico”, cheio de maneirismos, queria que fosse tal qual ele uma vez o disse: “um dia cometi a empáfia de dizer: mundo, mundo, vasto mundo, mais vasto é o meu coração”.
Também tive vontade de escrever sobre a Feira do Livro de Brasília. Quer dizer, o desastre que foi a abertura, a maneira amadora e desrespeitosa com que a organização tratou o público e o convidado homenageado Ariano Suassuna. Do barraco que fiz, das reclamações e da cara daquela gente apática e imbecilizada de aceitar ser tratada como lixo. E do absurdo maior que era ler em seus rostos a perturbação, o distúrbio que eu e mais algumas poucas pessoas indignadas estávamos causando.
Eu fiquei cansada só de pensar em argumentar que reclamar era nosso direito, mas aqui, quem exerce seus direitos é visto como chato e encrenqueiro. E eu, meu Vítor, não quero convencer ninguém de nada. Quer ser gado? Boa sorte! Mas não me peçam para juntar-me à manada.
Luciano Pavarotti. Sinto, lamento profundamente pela sua morte. Apesar da “crítica especializada” achar uma ofensa a popularização da ópera, um desperdício de tempo oferecer à gentalha o espetáculo destinado aos eruditos, eu adorava ver aqueles mega-eventos que ele proporcionava. Os “intelectuais” ainda acreditam que a massa não é digna de cultura, pelo menos não a verdadeira cultura ou a verdadeira arte.
Nesse sentido, acho que o texto do Carey – que eu citei naquele paper sobre a Clarice Lispector – extremamente atual, mas isso é conversa longa.
Sobre os livros. Eu não sou lá muito fã de listas, você bem sabe, meu Vítor. Contudo, eu adoro um veneninho, adoro brincar de advogado do diabo e a idéia de remexer no baú de orgulho e vaidade do cânone é uma delícia irrecusável.
Reforço novamente o que disse no meu comentário. Não precisavas te explicar. Não existe muita lógica – não a lógica que a racionalidade nos exige – a respeito do que nos toca ou não a alma. Os afetos estão no campo intuitivo e ponto. Pode ser uma comparação infeliz, mas nós sabemos que existe sexo e existe amor. Quando os dois caminham juntos, putz, é maravilhoso. Penso que o mesmo se dá com os livros. Existe o prazer e existe – vamos chamar – conhecimento. Se ambos vêm no mesmo exemplar, maravilha!
Quando digo que não suporto o Ulisses é porque o acho chato, enfadonho, redundante, cansativo. Antes de concluí-lo (o que eu considero um feito heróico), eu recomecei inúmeras vezes a leitura, e não fluía. E como você, sou incapaz de recordá-lo tamanha exaustão que me provocou. Mas não sou louca de não reconhecer a importância dessa obra para os estudos literários, tanto de crítica quanto de análise. Mas pessoalmente, esse livro é um raro caso que não me proporcionou nem prazer nem conhecimento.
Jorge Amado é considerado um grande escritor. Eu pessoalmente o acho pouco denso e bastante repetitivo. Passei pelos seus livros sem ser tocada, sem sentir mudanças. Sua literatura não alcançou minha memória, não me trouxe identificação ou reconhecimento com seu universo. Acho a Zélia Gattai, sua viúva, muito mais interessante.
O Nelson Rodrigues é outro nome que as pessoas enchem a boca para se referir. A mim, não me causa sequer cócegas. Tem dois textos deles que eu gosto muito. Vestido de Noiva e Toda nudez será castigada, todo o resto eu dispenso completamente. Na minha estante não tem um livro dele ou do Jorge Amado.
Macunaíma é um marco para o movimento modernista no Brasil, mas eu simplesmente não concordo com a abordagem do Mário sobre o estereótipo do brasileiro. Aquilo me incomoda. Diferente do Nelson Rodrigues e do Jorge Amado, essa obra permite um ótimo diálogo, um grande exercício de interpretação, mas não mudou minha vida, não me acrescentou em nada.
A casa dos budas ditosos, do João Ubaldo Ribeiro, foi para mim um total desencanto. É um livro encomendado, comercial e que não convence. A editora juntou grandes nomes para escrever sobre os sete pecados capitais. João Ubaldo ficou com a luxúria e meteu os pés pelas mãos. Criou uma personagem feminina que de feminino só tem o nome e o sexo, mas é de um machismo ridículo. Faltou sensibilidade para enxergar nosso olhar sobre a questão. E como entre erotismo e pornografia existe uma separação tênue... o livro é absolutamente tedioso. Na lista de desespero, esse seria o último item que eu usaria para excitar alguém. Mas para quem escreveu Viva o povo brasileiro, esse pecado já foi perdoado.
Querido, já é tarde. Depois continuamos a conversa.
Beijo imenso,

Tua Lu

sexta-feira, setembro 07, 2007

nota do dia (22)

a (não) reacção à morte de Luciano Pavarotti por parte da blogosfera lusa é sintomática...

confessionário (48)

Minha Lu,

aproveito a graça de uma tarde menos agitada para desenvolver contigo um assunto que tem criado um enorme zum zum nos blogues que leio habitualmente, refiro-me à famigerada corrente dos ‘10 livros que não mudaram as nossas vidas’ iniciada pelo Manuel A. Domingos. Bem sei que o tema se desvia do carácter intimista que atribuímos a esta série, mas tu terás, por certo, a mesma necessidade do que eu de dissecar o imbróglio.

Muita coisa tem sido escrita sobre a dita lista; já lhe chamaram passatempo de ociosos, já perguntaram se um livro possui realmente a capacidade de mudar a vida de alguém, já se publicaram dezenas de listas e respectivas reacções mais ou menos indignadas consoante o maior ou menor grau de belisco às obras tidas como consensuais pelo ‘cânone’, palavra que me custa imenso utilizar. Enfim, não sei se tiveste oportunidade de passear pela blogosfera lusa ultimamente, se o fizeste verás que o que escrevi é apenas um resumo desajeitado de tudo o que foi dito, face à quantidade de opiniões que têm sido divulgadas.

Quando elaborei a minha lista houve dois critérios que estabeleci como primordiais: o primeiro mencionei-o na pequena introdução que fiz e incidia na relação dos livros com a memória; o segundo não foi mais do que uma resposta objectiva à pergunta independentemente daquilo que ainda guardasse da leitura. Por exemplo, a escolha de ‘A Jangada de Pedra’ do Saramago ou de ‘Austerlitz’ de Sebald respondem inteiramente a este segundo critério – são livros que apesar de presentes na minha memória, pura e simplesmente não mudaram a minha vida, ainda que possa achar muito interessante o ensaio de Saramago sobre a ideia de uma Ibéria mais próxima de uma sensibilidade afro-americana do que europeia e de ter criado empatia com o personagem de Sebald cujas incongruências da memória o levam Europa fora à procura de um passado e de uma identidade. Há mesmo em ‘Austerlitz’ algumas passagens que nunca me saíram da cabeça, uma delas é a descrição minuciosa que Sebald (neste caso Austerlitz) faz da nova Biblioteca Nacional de França do Dominique Peurrault, lembro-me de estar na cama e de ter tido um hilariante ataque de riso enquanto lia essas páginas, nenhum crítico de arquitectura o teria feito melhor. O prazer da leitura não é suficiente para que um livro nos mude a vida, para que tal aconteça é necessário que o livro se imiscua no nosso pensamento e se torne uma parte de nós. Isso não me aconteceu com esses dois livros. É preciso que um livro nos proporcione mais do que prazer para que nos transforme a vida. Para aligeirar a coisa, e porque quero desde já dizer-te que faço esta análise do ponto de vista do leitor comum (até porque não tenho conhecimentos académicos para discutir o assunto cientificamente) proponho uma analogia meio despropositada mas que resume num ápice o que estou para aqui a dizer: tive imenso prazer a ver o ‘Shreek’, sim, o filme de animação, mas em nada mudou a minha vida ou a minha forma de pensar a vida, o mesmo não poderei dizer de filmes como ‘Elephant Man’ ou ‘Schindler’s List’ que me fazem reflectir continuamente sobre o que é realmente ser humano, o que é esta treta de ser um homem. Que fique bem claro que não estou a meter o ‘Shreek’ e ‘Austerlitz’ no mesmo saco, não vá a coisa começar a descambar…

Mas continuando com a minha lista e falando agora dos livros que não me deixaram marcas na memória e que constituem a grande parte dos títulos que escolhi. Por exemplo, se me pedisses para te falar sucintamente sobre ‘Nenhum Olhar’ do José Luís Peixoto, de ‘Quartéis de Inverno’ do Osvaldo Soriano, de ‘A Princesa’ do D.H. Lawrence ou de ‘Olhos Azuis, Cabelos Pretos’ da Marguerite Duras, eu, pura e simplesmente, seria incapaz de o fazer. A minha memória apagou-os completamente, ou quase completamente, eu próprio me questiono se realmente os li. O certo é que o fiz e a prova está em algumas linhas sublinhadas com que me deparo ao folheá-los. Fazendo um esforço para te poder dizer algo sobre esses livros, a minha memória não me diz mais do que isto: o livro do Peixoto tem uns personagens insólitos que me fizeram lembrar o Gabriel Garcia Marquez; ‘Quartéis de Inverno’ passa-se durante o período da ditadura militar na Argentina, de ‘A Princesa’ não ficou absolutamente nada e de ‘Olhos azuis, cabelos pretos’ da Duras guardo uma única imagem, uma imagem bela por sinal, mas que não consigo fixar ou relacionar com a acção do romance… é a imagem de um quarto virado para o mar, varrido pela luz de poente, quente e suave, cujos raios quase paralelos à terra acariciam dois corpos que se estendem nus num lençol branco… e há uma janela aberta, uma janela que permite esse cenário, uma janela alta e vertical de caixilho branco em madeira como algumas que encontramos nas casas de estilo colonial no Mindelo ou em Salvador. A imagem que guardo na minha cabeça é tão bela que hesitei em colocar o livro na lista, mas na altura voltei a fazer a pergunta, será que este instante de beleza mudou a minha vida? Não, não mudou, deu-lhe cor unicamente.

Não queria terminar esta conversa sem mencionar os restantes títulos. O que os une? O facto de serem os únicos livros que nunca consegui terminar até hoje; dois por puro aborrecimento (‘A Sibila’ e ‘O Vermelho e o Negro’) e o outro que, por incapacidade minha, falta de inteligência ou de sensibilidade ou de sei lá bem o quê, nunca consegui entrar realmente na lógica por muito que tenha tentado e esforçado, a saber ‘O Inominável’ do Beckett. Ao contrário de todos os outros e furtando-me ao critério que usaste para elaborar a tua lista (os livros que não tens vontade de reler), ‘O Inominável’ de Beckett é um livro ao qual pretendo regressar, acho que houve ali uma incompatibilidade qualquer que ficou por resolver e duvido que tenha sido uma resistência minha, a ver vamos…

Tenciono continuar este diálogo, escrevendo-te sobre os outros livros, os que me acompanham diariamente, explicando-te em que medida mudando-me, eles acabaram por mudar a minha vida.

O teu,

Vítor.

quarta-feira, setembro 05, 2007

nota do dia (21)

já passaram três meses e a minha soph vai amanhã embora... esta casa vai ficar sem luz.

já agora, e porque nunca o fiz no Sincronicidade, os 10 livros mais importantes da minha vida

por ordem de enamoramento:

1. 'As Ondas', Virginia Woolf*
2. 'Alexis', Marguerite Yourcenar*
3. 'Livro do Desassossego', Bernardo Soares (Fernando Pessoa)
4. 'O Estrangeiro', Albert Camus
5. 'Os Passos em Volta', Herberto Helder
5. 'Espera de Deus', Simone Weil
6. 'Elogio da Velhice', Hermann Hesse*
7. 'Sinais de Fogo', Jorge de Sena
8. 'Em Busca do Tempo Perdido' (7 vols.), Marcel Proust
9. 'Quarteto de Alexandria' (4 vols.), Lawrence Durrell
10. 'Se Isto é um Homem', Primo Levi*

e vou ter que fazer batota, adicionando 4 livros que também foram extremamente importantes para mim.

11. 'Se Numa Noite de Inverno um Viajante', Italo Calvino*
12. 'As Horas', Michael Cunningham
13. 'A Paixão Segundo G.H.', Clarice Lispector*
14. 'Sob o Olhar de Medeia', Fiama Hasse Pais Brandão

*destes autores escolho apenas o livro que mais me marcou do conjunto das suas obras... caso contrário a lista passaria para vinte títulos e uma batota não chegaria...

passo a palavra aos mesmos amigos dos 10 menos.

terça-feira, setembro 04, 2007

Ai que adoro falar mal da vida alheia... hahaha

Meu Vítor, eis aqui a minha lista. Ela está incompleta, tentei encontrar dez títulos, mas só consegui nove. Se no decorrer da semana eu me lembrar de mais algum, prometo incluir. Estes aqui são aqueles que não me despertam a menor, a mais ínfima vontade de uma segunda leitura. Isso não significa que não foram importantes para minha vida. Foram. Eles me ensinaram que o cânone literário não é um dogma religioso e que eu sobrevivo – muito faceira, por sinal – aos olhares congelantes e narizes tortos dos sábios acadêmicos.
Queridão, isso podia virar uma série chamada "Veneninho literário". Hahaha!

And the Oscar goes to:

1. O chatíssimo Ulisses, James Joyce;
2. Dona Flor e seus dois maridos, Jorge Amado*;
3. A dama do lotação, Nelson Rodrigues;
4. Macunaíma, Mário de Andrade;
5. As geórgicas, Claude Simon;
6. Um céu de estrelas, Fernando Bonassi;
7. Eurico, o presbítero, Alexandre Herculano;
8. A casa dos budas ditosos, João Ubaldo Ribeiro;
9. O apanhador no campo de centeio, J.D. Salinger.

* - Para mim, só se salvam do Jorge Amado, Capitães de Areia e A morte e a morte de Quincas Berro D’água.

segunda-feira, setembro 03, 2007

10 Livros que Não Mudaram a Minha Vida

O Manuel A. Domingos iniciou uma corrente intitulada 'os 10 livros que não mudaram a minha vida'. O desafio ainda cá não chegou, mas achei o exercício tão interessante e tenho tanta curiosidade em saber qual será a lista da Lu que resolvi antecipar-me. Falamos sempre dos livros que nos marcaram, que mudaram as nossas vidas, mas, talvez por pudor, nunca referimos os livros que nos aborreceram de morte... o meu barómetro para classificar um livro como 'bom' ou 'mau' é a memória, os 'bons' moram nela para sempre, ressurgindo passagens ou detalhes a todo o momento, os 'maus' caem completamente no esquecimento e só a estante me diz que um dia estiveram nas minhas mãos. Alguns poderão achar um crime, mas cá vai então a lista dos 10 livros que não mudaram a minha vida:

(nesta lista incluo apenas ficção)

1. 'A Sibila', Agustina Bessa-Luís
2. 'O Inominável', Samuel Beckett
3. 'Nenhum Olhar', José Luís Peixoto
4. 'O Vermelho e o Negro' (2 vols.), Stendhal
5. 'A Jangada de Pedra', José Saramago
6. 'Quartéis de Inverno', Osvaldo Soriano
7. 'Austerlitz', W.G. Sebald
8. 'A Princesa', D.H. Lawrence
9. 'Olhos Azuis, Cabelo Preto', Marguerite Duras
10. 'Paris é uma Festa', Ernest Hemingway

Lu, fico à espera da tua lista... estou curioso em relação às escolhas do Carlos, do António Ferro, da Fátima e da Sandra Costa.