terça-feira, abril 24, 2007

nota do dia (7)

o mundo é muito pequeno.

segunda-feira, abril 23, 2007

Garrafas ao mar (1)

Porque há coisas que é melhor nem saber.

sexta-feira, abril 20, 2007

Literatura


Por Rodrigo Petronio*

Pode parecer estranho, mas há um desconhecimento mútuo entre Portugal e Brasil no que diz respeito à literatura, sobretudo à poesia. Excetuando-se alguns casos extremos, é quase inexplicável que ocorra isso com dois países que têm laços históricos seculares e para os quais não há obstáculo lingüístico. A Editora Escrituras criou um projeto que pretende atenuar essa distância. Trata-se da Coleção Ponte Velha.
Já com vários títulos publicados na área de poesia, praticamente todos de autores até então inéditos em livro no Brasil, a Ponte Velha vem demonstrar a possibilidade desse diálogo. Coordenada pelos poetas Carlos Nejar e António Osório, o diálogo com Portugal começou com as antologias deste último e da poeta, difusora de literatura e também diretora do suplemento cultural do jornal A Notícia, de Lisboa, Ana Marques Gastão, chamada A Definição da Noite. Em seguida vieram os livros de Rosa Alice Branco, Nuno Júdice e Pedro Tamen, respectivamente, Soletrar o Dia, Por Dentro do Fruto a Chuva e Caronte e Memória.
Seguiram-se os livros de Ana Hatherly, A Idade da Escrita, e de Cruzeiro Seixas, Homenagem à Realidade. São dois destaques interessantes da Ponte Velha, posto que trazem também um belo conteúdo gráfico. O primeiro, com os poemas visuais e as caligrafias de Hatherly, e o segundo com mostras da obra plástica de Seixas, que é um dos principais nomes do surrealismo português, ao lado Mário Cesariny e Antonio Maria Lisboa.
Um dos destaques também é o livro Animal Olhar, antologia poética de António Ramos Rosa. Um dos mais importantes nomes da poesia de língua portuguesa, Ramos Rosa é autor de uma obra tão vasta quanto complexa. A antologia tenta dar conta dessa grande dimensão, selecionando poemas de seus livros mais representativos. Também traz desenhos feitos pelo próprio Ramos Rosa e alguns poemas inéditos. Trata-se de um poeta de amplos vôos imaginativos e de fortes implicações filosóficas.
Recentemente, a Ponte Velha apresentou diversos títulos e algumas novidades. Dentre eles se encontram Olhares Perdidos de Nicolau Saião, Armas Brancas e Outros Poemas de Armando Silva Carvalho, Palavras Noturnas e Outros Poemas de Isabel Meyrelles e O Arco da Palavra de João Barrento, todos estes organizados por Floriano Martins. A novidade é a entrada do gênero ensaio na coleção, representada pela coletânea de ensaios de Barrento, estudioso de literatura alemã e grande tradutor de autores como Goethe, Trakl e Walter Benjamin. O livro de Meyrelles deve ser ilustrado com obras da própria autora, que é artista plástica.
Paralelamente à Ponte Velha, valem ser ressaltadas iniciativas individuais de algumas editoras de difundir essa poesia de tão boa qualidade. Além da conhecida publicação de boa parte da obra de Fernando Pessoa levada a cabo pela Companhia das Letras, recentemente a editora A Girafa publicou, do Fernando Pessoa ortônimo, Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal, uma reunião de fragmentos sobre ele mesmo, vida e arte, e A Educação do Estóico, que escreveu sob o heterônimo de Barão de Teive. Também de Herberto Helder há a ótima antologia da editora Iluminuras chamada O Corpo O Luxo A Obra, com seleção e apresentação de Jorge Henrique Bastos e posfácio de Maria Lúcia Dal Farra. E, recentemente, a Azougue Editorial lançou uma belíssima edição do exuberante Os Passos em Volta, livro de contos do mesmo autor. É ler para crer.
* Rodrigo Petronio é escritor e autor de História Natural, Transversal do Tempo e Pedra de Luz, entre outros.

quarta-feira, abril 18, 2007

*

nota do dia (6)

volto ao sul, como quem tem sede de luz... vuelvo al sur, como se vuelve siempre al amor...

terça-feira, abril 17, 2007

As matriarcas (8)

Fui esperar Tiziu em frente da Escola Municipal. Pelo pouco que já conheço do moleque, cheguei com dez minutos de antecedência para não perdê-lo de vista. Levado como era, imaginei que ao primeiro toque do alarme, ele sairia voando pelo portão, doido para deixar a “masmorra” para trás. Errei. Ele nem esperou o alarme soar, cinco minutos antes do horário, Tiziu saiu pelo portão com o passo apressadinho como se não quisesse dar oportunidade de ser agarrado pelo bedel do colégio. Ele enxergou-me de longe e veio saltitando em minha direção como os olhos arregalados:
- D. Olívia!
- Tiziu!
- A professora já tinha terminado, viu? Não fugi da aula, não senhora.
- Eu não disse absolutamente nada, Tiziu.
- Mas antes que a senhora diga...
- Não estou aqui para vigiar você. Fique calmo. Vim porque combinamos um passeio de bicicleta para mais tarde, mas antes preciso ir a um lugar.
- Que lugar é esse?
- Uma casa que fica no Largo da Esperança.
- No Largo da Esperança? De quem é a casa?
- Foi da minha família: bisavós, avós, minha mãe e agora é minha. Mas ela está fechada há alguns bons anos.
- Não gosto de ir por aquelas bandas, D. Olívia.
- E por quê?
- Porque tem muita alma por lá.
- Como é, menino? Que história é essa?
- Falam que lá tem uma casa assombrada que pertenceu à D. Maria da Anunciação. Em algumas noites, uma dona doida anda pelas ruas do largo, vestida de Maria Madalena...

Minha visão ficou turva e a voz de Tiziu foi sumindo, sumindo até que não ouvi mais nada.

sexta-feira, abril 13, 2007

"Já o disse com a certeza que sempre se confere às afirmações insignificantes. A blogosfera é uma coisa medonha. Aborrece-me a maneira como a gente nela se escancara, de perna aberta, tal qual uma puta fácil, de lábios esborratados de baton carmim, partilhando intimidades, esculpindo a imagem que queremos que os outros tenham de nós. Eu, pelo menos, minto descaradamente, com os dentes todos, que é para me imaginarem interessante, escarnecer dos outros e sentir-me, insana que sou e me quero, diferente. Aborrece-me, sobretudo, a democraticidade da coisa. Qualquer intelectual de meia tigela armado ao pingarelho tem um blog. Qualquer pretenso comentador político escalpeliza, numa diarreia de textos ilegíveis, factos, histórias, notícias. Qualquer rocinante, que zurra aos quatro ventos a sua equídea natureza, largando cagalhões gigantes cor de palha, tem um blog. Qualquer miúda fantástica da Reboleira, daquelas que usam óculos escuros gigantes e, por isso, se assemelham a moscas de olhos metalizados, tem um blog. Enfim, qualquer badamerda tem um blog. Coisa triste, escrever num blog.
(Hoje, confesso, estou especialmente bem disposta. Há sol. Eu sou do sul. Alimento-me de luz e de sol.)"

nota do dia (5)

let's dance!

Ainda sobre o narrador...

Após reler o "Narrador" de Walter Benjamin, fui escolhida por um vídeo lindo, singelo, de uma delicadeza real. Trata-se de um filme grego chamado O tempero da vida (Politiki Kouzina/ A touch of spice). Há tempos não via um filme tão exuberante (como a vida é). Muitas vidas, odores, paladares se cruzam e enriquecem a experiência humana.
O avô do filme é o típico narrador proposto por Benjamin, ele tem muitas histórias a contar e as conta de um modo absolutamente poético e prático. Ele vende especiarias numa pequena loja em Istambul e sabiamente ensina ao seu neto as lições do colégio a partir do sabor dos temperos e torna-se uma referência ímpar para ele.
A culinária serve de pretexto para que questões mais profundas sejam discutidas: a identidade cultural, filosofia, política e o amor.
Mais tarde, avô e neto separam-se devido aos conflitos entre a Grécia e o Chipre. É aí então que esse menino transforma-se num homem e aprende que não é só a comida que precisa de tempero.

quinta-feira, abril 12, 2007

nota do dia (4)

nada a declarar.

quarta-feira, abril 11, 2007

assim, com a mesma impetuosidade desta querida


Love for Sale (Live at Yoshi's), Dee Dee Bridgewater

nota do dia (3)

todas as acções têm consequências. (apanhado algures no filme do David Lynch)

terça-feira, abril 10, 2007

nota do dia (2)

não há estrelas no céu do porto.

como um...

Embrulho

A pele tornou-se-me exigente, dir-se-ia que me passa através das frestas que os pensamentos deixam abertas entre si, ou entre os pensamentos e a memória, e que por vezes os envolve como se eles fizessem parte do meu corpo. Eu mais não sou então do que um embrulho de memória, atado pelas veias e lacrado pelo espírito.
Entre cada um dos meus poros e o que deles diviso no meu espírito há uma corda, uma espécie de cabo onde circula a realidade ou onde, de quando em quando, ela aparece pendurada. Há quem nessas alturas a confunda com a pele, mas é só porque a roupa então se cola aos sentimentos que podemos vislumbrar o firmamento através deles.
Poesia Completa (Dom Quixote), Luís Miguel Nava

Sin pena ni gloria, 1999, Antonio Seguí

segunda-feira, abril 09, 2007

nota do dia (1)

olho para o visor do telemóvel e a única palavra que aparece escrita é silêncio.

já há algum tempo que andava para dizer isto: a sandra tem uma música linda no blogue dela.
*

Um (quase) anedotário

Após meu jejum quaresmal, fui concluir minha preparação para a Páscoa do Senhor: encaminhei-me ao confessionário - o outro. Um padre conhecido meu de longa data recebeu-me para uma conversa franca e informal. Meu Vítor, não tens idéia de como esse diálogo foi enriquecedor! Para continuar numa linguagem bíblica, tu que sabes como poucos meu 'calvário' dos últimos tempos podes imaginar o teor desse encontro.
Lá pelas tantas, depois de muito desabafo, revolta, sorrisos, lágrimas, questionamentos teológicos, ele olha-me nos olhos e diz:
- Filha, posso fazer uma pergunta?
Digo que sim e ele não titubeia.
- O que falta para a Luciana ser feliz?
Dei um monte de respostas dignas de um bom acadêmico, mas completamente vazias de alma.
Ele continuou:
- Você tem medo de quê? De fazer merda? Filha, merda aduba a vida.
Sorrimos juntos em uníssono.
Nunca celebrei uma Páscoa com tanta leveza e com a certeza de que uma nova pessoa renasceu.

domingo, abril 08, 2007

Páscoa

Hoje celebrei de uma assentada a Sexta-Feira Santa, o Sábado Aleluia e o Domingo de Páscoa… uma sucessão de acontecimentos com lógica idêntica ao tríodo paixão, ascensão e ressurreição. É sempre bom quando a última é a que vinga nas nossas vidas. O próprio Cristo já sabia disso, se não nunca cá teria posto os pés.

quarta-feira, abril 04, 2007

imagens que se colam ao peito (19)

'Maria Madalena',1858-60, óleo sobre madeira, Delaware Museum, EUA, Anthony Frederick Sandys

Na estante (9)

Por mais familiar que seja seu nome, o narrador não está de fato presente entre nós, em sua atualidade viva. Ele é algo distante, e que se distancia ainda mais (...). Uma experiência quase cotidiana nos impõe a exigência dessa distância e desse ângulo de observação. É a experiência de que a arte de narrar está em vias de extinção. São cada vez mais raras as pessoas que sabem narrar devidamente. Quando se pede num grupo que alguém narre alguma coisa, o embaraço se generaliza. É como se estivéssemos privados de uma faculdade que nos parecia segura e inalienável: a faculdade de intercambiar experiências.
Umas das causas desse fenômeno é óbvia: as ações da experiência estão em baixa, e tudo indica que continuarão caindo até que seu valor desapareça de todo. Basta olharmos um jornal para percebermos que seu nível está mais baixo que nunca, e que da noite para o dia não somente a imagem do mundo exterior mas também a do mundo ético sofreram transformações que antes não julgaríamos possíveis. Com a guerra mundial tornou-se manifesto um processo que continua até hoje. No final da guerra, observou-se que os combatentes voltavam mudos do campo de batalha não mais ricos, e sim mais pobres em experiência comunicável. E o que se difundiu dez anos depois, na enxurrada de livros sobre a guerra, nada tinha em comum com uma experiência transmitida de boca em boca. Não havia nada de anormal nisso. Porque nunca houve experiências mais radicalmente desmoralizadoras que a experiência estratégica pela guerra de trincheiras, a experiência econômica pela inflação, a experiência do corpo pela guerra de material e a experiência ética pelos governantes. Uma geração que ainda fora à escola num bonde puxado por cavalos se encontrou ao ar livre numa paisagem em que nada permanecera inalterado, exceto as nuvens, e debaixo delas, num campo de forças de torrentes e explosões, o frágil e minúsculo corpo humano.

"O narrador" in Obras escolhidas: magia e técnica, arte e política. Walter Benjamin

Radiola (8)

Suburbano coração

(Chico Buarque)
A casa está bonita
A dona está demais
A última visita
Quanto tempo faz
Balançam os cabides
Lustres se acenderão
O amor vai pôr os pés
No conjugado coração
Será que o amor se sente em casa
Ou vai sentar no chão
Será que vai deixar cair
A brasa no tapete coração
Quanto aumentar a fita
As línguas vão falar
Que a dona tem visita
E nunca vai casar
Se enroscam persianas
Louças se partirão
O amor está tocando
O suburbano coração
Será que o amor não tem programa
Ou ama com paixão
Mulher virando no sofá
Sofá virando cama coração
O amor já vai embora
Ou perde a condição
Será que não repara
A desarrumação
Que tanta cerimônia
Se a dona já não tem
Vergonha do seu coração

segunda-feira, abril 02, 2007

"Nem que as sombras se dissipem, nem que o pó se submeta à força da luz clara do dia; negar duas vezes a destruição não te restituirá os alicerces da casa. Apenas anuncia a terceira negação: o esquecimento."

Pasolini

Comecei a ler ‘Uma vida violenta’ de Pier Paolo Pasolini. Não há uma pausa, uma analepse, uma reflexão… nada que eu possa ‘sublinhar’ e partilhar. Por outro lado, a acção corre a um ritmo veloz, imagens e sons sucedem-se de forma estonteante como se fosse um filme, ou não escrevesse ele com mão de cineasta. As mesmas imagens são tão poderosas e estimulam de tal forma a imaginação do leitor que por vezes esquecemo-nos de que não somos habitantes dos subúrbios de Roma… Se eu pudesse partilhar as sensações que Pasolini desperta na minha imaginação este blogue, enquanto durasse a leitura, seria uma coisa muito diferente.

uma palavra faz a diferença

'MAR' em português é um substantivo masculino; em francês o correspondente 'LA MER' é um substantivo feminino. É-me impossivel imaginar o mar como uma mulher, como será impossível a um francês imaginá-lo como um homem. Aparentemente próximos, os nossos imaginários podem ser substancialmente diferentes.