quarta-feira, dezembro 13, 2006

Confessionário (38)



Black on Gray, 1969, Mark Rothko

Minha amiga, aqui estou como prometi, apesar dos dois dias de atraso. Antes de mais quero dizer-te que a nossa conversa sobre a espiral e o quadrado ainda não está encerrada. Tenho muita vontade de continuar o diálogo, de o aprofundar, de o relacionar com a arte e com a natureza. Kandinsky era uma pista, Rothko será outra... enfim, tempo haverá para dissertar sobre o poder da abstracção e as suas pontes com a vida.
Muito tem acontecido nestes últimos dias. Creio que coisas a mais! Boas e más. Certas e incertas. A vida por vezes obriga-nos a acelerar o passo; o meu receio é de não conseguir acompanhá-la ao mesmo ritmo. A seu tempo terei as respostas.
Há no meu afastamento recente do blogue um duplo porquê. Por um lado, a escassez de tempo inerente ao trabalho dos últimos dias, por outro, uma certa necessidade de me ausentar de um meio que sentia roubar-me muita energia. Esta distância permitiu-me perceber de forma muito clara a razão porque escrevo e quero continuar a escrever nesta casa. Percebi que estou preso ao Sincronicidade pela amizade que nos une e pelo diálogo fraterno que mantemos. Uma altura perguntei-me porque razão o blogue não era muito visitado. Na época ocorreram-me várias respostas: não é uma página interessante, é chato, é sério e lírico demais, não há sentido de humor, é enfadonho... uma série de quês que provavelmente constituirão no seu conjunto a grande resposta. A distância dos últimos dias fez-me perceber claramente porque é que somos pouco visitados e ainda menos lidos: nesta casa habitam realmente duas pessoas e parece não sobrar espaço para terceiros.
Somos nós próprios a causa da distância. As nossas confissões, talvez extremamente íntimas, assustam, criam receios, beliscam o pudor de quem nos visita. Percebi que continuo este espaço por mim e por ti exclusivamente. Percebi que é um acto egoísta, egocêntrico, que só a nós interessa, e que só desse modo deverá ser continuado. Sei que existem pessoas que se tornaram cúmplices desta partilha e que, porventura, encontraram nesta casa uma qualquer afinidade de sensibilidades. Não vale a pena nomearmos esses amigos. Os dois sabemos quem são. Eles também sabem. Tenho um respeito imenso por todos, pelo carinho e amizade que nos disponibilizam sem nada pedirmos, digo isto do fundo do coração.
Minha querida, este é o nosso médium, o nosso veículo. Não é nem deve ser mais do que isso. É assim que pretendo continuá-lo. Ainda mais íntimo, ainda mais intenso, ainda mais descarado e sem pudor, sem medo, amiga, sem medo. Já pensei sugerir-te em transformarmos o Sincronicidade num espaço completamente privado, sem esta exposição pública característica da blogosfera; um Sincronicidade feito de e-mails ou cartas à moda antiga, feito de cadernos de apontamentos, manuscritos, imagens gravadas em papel, mas temo pela nossa disciplina. Quer se queira ou não, este formato obriga-nos a uma actualização diária e continuada, caso contrário acaba por morrer. É essencial um exercício de escrita diário, sinto-o na evolução dos nossos textos. Teremos de futuro tempo para equacionar tudo isto com tranquilidade.
Está para breve o aniversário deste espaço e não sabes a alegria que vou ter de comemorá-lo contigo ao vivo e a cores em Brasília. Faltam poucos dias para ficarmos dia e noite a conversar sobre aquilo que não escrevemos ao longo deste ano. Mal posso esperar! Tenciono publicar apenas um poema da Cristina Campo antes de partir para o Brasil no próximo dia 21. Será o meu presente de Natal para todos aqueles que insistem em testemunhar esta amizade.
Um beijo.

6 comentários:

Lu disse...

Obaaaaaaaaaaa!
Há exatamente dois dias venho aqui, de hora em hora, buscar teu confessionário e oxalá, ele chegou!!! :))
Estava com saudades de ler-te assim tão a cru, que é a maneira como mais gosto de devorar-te.
Sobre o blogue, teremos tempo de dialogar e decidir se convém passar o cadeado no portão.
A princípio, não faço qualquer objeção, mas deixa eu usar uma metáfora, contar uma historinha.
Lembro-te que nosso intuito primeiro era dividir uma casa e, de vez em quando, receberíamos os amigos para um bom vinho e gargalhadas.
Quando duas pessoas decidem morar juntas, o que elas têm em mente é a construção um espaço íntimo. Neste espaço, há lugar para família, amigos, tristezas, felicidades, realizações, frustrações. Mas a família e os amigos não moram com o casal.
Assim é nosso blogue. Escrevemos (ou decoramos a casa) conforme nosso gosto, conforme nosso crescimento. Eu espero que as pessoas que entram aqui para compartilhar, digam de si para si: nossa, mas isso é a cara deles!

É isso que importa, que seja a nossa cara. E que as pessoas sintam-se abraçadas e bem quistas enquanto se hospedam conosco. Depois, cada um vai pra sua casa e nós continuamos a partilhar nossa intimidade e a crescer em espírito e alma.

Eu escrevo, Vítor, porque não me imagino fazendo outra coisa e escrevo, esse blogue, em particular, para regar nosso amor. Para construir uma história de fraternidade contigo. Você existe para além do virtual. Ponto.

Comemoraremos nosso primeiro ano de "casados" numa lua-de-mel em Brasília. Será inesquecível! hahahaha

Beijos ansiosos.

Agripina Roxo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Agripina Roxo disse...

muito bonita esta confissão :)
ainda bem que há dois seres como vocês que partilham na escrita a vida de cada um, os medos, as alegrias, as emoções :)

gosto muito desta casa de afectos, e peço desculpa por também eu estar tão ausente :(

tal como o Vítor tenho andado um bocadinho fugida deste mundo, pelo cansaço talvez, pelo tempo, pela necessidade de me reencontrar, e claro que isso se reflecte nas minhas escassas visitas ao vosso cantinho

mas hoje estou aqui, e sabe-me assim a vinho do Porto, a música, a calma, a serenidade, o sabor, e o calor das palvras :)

eu sei que parece um pouco tolo, mas sabe-me bem, e espero sinceramente que nunca deixem de manter este espaço :)

um beijinho muito grande para os dois, ou dois beijinhos muito grandes ;)

frosado disse...

Boa viagem e bons encontros com a Lu. Sejam felizes! Eu também já fui muito feliz no Brasil(Salvador e Ceará)e espero voltar. Beijos para todos!

Vítor Leal Barros disse...

agripina e fátima, um beijo às duas

Lu disse...

Agripina querida, os bons sentimentos nunca são tolos embora haja quem insistentemente tente nos provar o contrário. É só por isso que a vida vale a pema: por essas 'tolices'. Beijão.
Fatinha seja você também muito feliz. Beijoca.
Carlinhos, é assim que tenho o sorriso: largo, bem largo. Beijoca.