Maison à Lège, 1998, Cap Ferret, França, Lacaton & Vassal
Desde a entrevista que a Ana Sousa Dias fez à arquitecta/artista Françoise Schein no programa ‘Por Outro Lado’ da Dois, que eu não ouvia/lia um discurso e uma abordagem à arquitectura tão interessantes como os que pude constatar na entrevista que José Adrião e Ricardo Carvalho fizeram aos franceses Lacaton & Vassal na última edição do Jornal dos Arquitectos.
Uma das coisas que mais me incomoda em arquitectura é a linguagem extremamente abstracta e convencional que os arquitectos utilizam na explicação dos conceitos e ideias que sustentam os seus trabalhos. Não é raro escutarmos em conferências termos como, escala, desenho, forma, volume, eixo, simetria, assimetria, fio condutor, espacialidade, percurso, textura… (podíamos continuar por aí adiante), palavras caríssimas à classe e que pouco ou nada dizem ao cidadão comum, que é, nada mais nada menos, o destinatário e usufruidor final das obras de arquitectura. Lembro-me de há uns 3 ou 4 anos atrás ter frequentado um seminário de três dias sobre critica de arquitectura e de, em cerca de 15 emissores, notar que apenas um ou dois tinham uma preocupação declarada em relação às pessoas, aos cidadãos anónimos que “consomem” as obras dos arquitectos. Todos os outros preocuparam-se mais em justificar os seus princípios e conceitos aos colegas do que em pensar uma arquitectura que responda com inteligência às necessidades reais do cidadão comum.
É exactamente por contrariar essa tendência, que o discurso da dupla de arquitectos franceses Lacaton & Vassal me fascinou. Já conhecia alguns dos seus trabalhos do tempo da faculdade, como a casa Latapie, na altura exposto por uma das melhores professoras que tive, a arqª. Teresa Novais. A simplicidade construtiva, as preocupações sempre presentes de conforto e bem-estar, a adequação da arquitectura às necessidades reais das pessoas que a vão usar e habitar, foram temas explorados na altura e que hoje tive oportunidade de rever enquanto lia a entrevista do JA. Mas houve outros aspectos que me marcaram imenso e que só encontro paralelo quando me debruço sobre o trabalho de alguns arquitectos latino-americanos ou europeus que trabalharam nesses países, como Barragán e Lina Bo Bardi (pós estilo-internacional) e Jorge Mário Jáuregui, Manoel Ribeiro e Françoise Schein (contemporâneos), e que se prendem com ideias de optimismo, sustentabilidade, reciclagem e colonização do espaço por aqueles que o utilizam. O posicionamento de Jean Philippe Vassal em relação aos grandes aglomerados dos subúrbios de Paris é muito elucidativo: “Demonstramos que em termos económicos era muito vantajoso, já que com metade do dinheiro podíamos fazer duas vezes mais edifícios e ao mesmo tempo optimizávamos as condições dos edifícios existentes, pela sua transformação. (…) Insistimos principalmente na questão dos edifícios. A maior parte dos arquitectos ou urbanistas pensa que o espaço público é o grande problema, mas nós pensamos que todos os projectos têm que começar no interior dos edifícios. (…) Dentro dos edifícios cada família torna-se cliente. É necessário ir a cada piso e perceber quais são as necessidades quer individuais quer comunitárias. (…) É portanto, fazer o trabalho a partir do existente, de modo bastante delicado, mesmo com pessoas a viver aí, tentar incomodá-los o mínimo possível e pensar que a solução vai sempre ser encontrada. (…) O que quero dizer é que é necessário ser optimista. É muito mais importante ver as coisas positivas que existem do que as negativas. Encontrar soluções para resolver os pontos negativos e manter as coisas boas que existem e reforçá-las.” Todo este discurso fez-me lembrar de um dos períodos mais bonitos da arquitectura portuguesa, na época do SAAL (Serviço Ambulatório de Apoio Local), que infelizmente morreu com o arrefecer da euforia pós-revolução. Apesar de tudo, continuo a acreditar que com pouco pode-se fazer muito (já diziam os Índios da Meia Praia). Para concluir, cito a parte que mais me tocou de toda a entrevista, e que foi um dos testemunhos mais bonitos que li sobre esta profissão: “De facto, não estamos muito preocupados na questão da obra, da obra do arquitecto. Para mim o que é mais importante é o que se faz ou fez durante a vida, e o modo como se trabalhou, muito mais do que considerar um projecto em particular como uma obra ou se esta dura ou não para a eternidade.” Mais à frente acrescenta: “A Arquitectura pode ser uma coisa leve, suave, gentil e precisa.”
Uma das coisas que mais me incomoda em arquitectura é a linguagem extremamente abstracta e convencional que os arquitectos utilizam na explicação dos conceitos e ideias que sustentam os seus trabalhos. Não é raro escutarmos em conferências termos como, escala, desenho, forma, volume, eixo, simetria, assimetria, fio condutor, espacialidade, percurso, textura… (podíamos continuar por aí adiante), palavras caríssimas à classe e que pouco ou nada dizem ao cidadão comum, que é, nada mais nada menos, o destinatário e usufruidor final das obras de arquitectura. Lembro-me de há uns 3 ou 4 anos atrás ter frequentado um seminário de três dias sobre critica de arquitectura e de, em cerca de 15 emissores, notar que apenas um ou dois tinham uma preocupação declarada em relação às pessoas, aos cidadãos anónimos que “consomem” as obras dos arquitectos. Todos os outros preocuparam-se mais em justificar os seus princípios e conceitos aos colegas do que em pensar uma arquitectura que responda com inteligência às necessidades reais do cidadão comum.
É exactamente por contrariar essa tendência, que o discurso da dupla de arquitectos franceses Lacaton & Vassal me fascinou. Já conhecia alguns dos seus trabalhos do tempo da faculdade, como a casa Latapie, na altura exposto por uma das melhores professoras que tive, a arqª. Teresa Novais. A simplicidade construtiva, as preocupações sempre presentes de conforto e bem-estar, a adequação da arquitectura às necessidades reais das pessoas que a vão usar e habitar, foram temas explorados na altura e que hoje tive oportunidade de rever enquanto lia a entrevista do JA. Mas houve outros aspectos que me marcaram imenso e que só encontro paralelo quando me debruço sobre o trabalho de alguns arquitectos latino-americanos ou europeus que trabalharam nesses países, como Barragán e Lina Bo Bardi (pós estilo-internacional) e Jorge Mário Jáuregui, Manoel Ribeiro e Françoise Schein (contemporâneos), e que se prendem com ideias de optimismo, sustentabilidade, reciclagem e colonização do espaço por aqueles que o utilizam. O posicionamento de Jean Philippe Vassal em relação aos grandes aglomerados dos subúrbios de Paris é muito elucidativo: “Demonstramos que em termos económicos era muito vantajoso, já que com metade do dinheiro podíamos fazer duas vezes mais edifícios e ao mesmo tempo optimizávamos as condições dos edifícios existentes, pela sua transformação. (…) Insistimos principalmente na questão dos edifícios. A maior parte dos arquitectos ou urbanistas pensa que o espaço público é o grande problema, mas nós pensamos que todos os projectos têm que começar no interior dos edifícios. (…) Dentro dos edifícios cada família torna-se cliente. É necessário ir a cada piso e perceber quais são as necessidades quer individuais quer comunitárias. (…) É portanto, fazer o trabalho a partir do existente, de modo bastante delicado, mesmo com pessoas a viver aí, tentar incomodá-los o mínimo possível e pensar que a solução vai sempre ser encontrada. (…) O que quero dizer é que é necessário ser optimista. É muito mais importante ver as coisas positivas que existem do que as negativas. Encontrar soluções para resolver os pontos negativos e manter as coisas boas que existem e reforçá-las.” Todo este discurso fez-me lembrar de um dos períodos mais bonitos da arquitectura portuguesa, na época do SAAL (Serviço Ambulatório de Apoio Local), que infelizmente morreu com o arrefecer da euforia pós-revolução. Apesar de tudo, continuo a acreditar que com pouco pode-se fazer muito (já diziam os Índios da Meia Praia). Para concluir, cito a parte que mais me tocou de toda a entrevista, e que foi um dos testemunhos mais bonitos que li sobre esta profissão: “De facto, não estamos muito preocupados na questão da obra, da obra do arquitecto. Para mim o que é mais importante é o que se faz ou fez durante a vida, e o modo como se trabalhou, muito mais do que considerar um projecto em particular como uma obra ou se esta dura ou não para a eternidade.” Mais à frente acrescenta: “A Arquitectura pode ser uma coisa leve, suave, gentil e precisa.”
3 comentários:
um bom São João :)
para ti tb
olá vitor
uma posta muito boa e que li com muito agrado
antónio
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