segunda-feira, abril 03, 2006

A volta do romance a prestação

Relendo a matéria abaixo, ficou-me a seguinte indagação?
Os blogs ditos literários não estariam cumprindo a antiga função dos folhetins do séc. XIX?
Artistas comprometidos com a palavra estão oferecendo seu ofício em parcelas cotidianas.
Muitas são as razões. De um lado, o perverso, cito a dificuldade de publicar - maior pesadelo de 10 entre 10 escritores sem visibilidade; de outro está a democratização do livro e o consequente acesso à literatura, uma vez que os livros custam, pelo menos, 10 vezes mais que os folhetins.

Vítor, eu sei que é de uma presunção sem par, mas as séries esquissos, missivas, confessionário (e outas tantas que existem por aí) não seriam exemplos dessa "escrita aos pedaços" ?

Isso fez-me lembrar do dito que temos por cá: amor aos pedaços.

As doçuras e delicadezas da vida acontecem assim, aos bocados: os vinhos, os sorvemos aos goles; as tortas mais deliciosas são servidas em pequenas fatias; a refeição requintada em pequenas porções; o amor em doses diárias...

Ah, sim, é bom quando tudo chega numa só tacada, nos arrebatando aos céus. Contudo, essa tacada não tem seu fim em si. Talvez por isso queiramos repetir ao longo da vida os momentos de felicidade... ah, mas isso já é uma outra conversa.
O romance-folhetim surgiu no século XIX, no rodapé das páginas de jornal, com um pontilhado indicando a linha para ser recortada. Obras de autores como Balzac, Flaubert e Victor Hugo foram assim apresentadas para seus leitores: em capítulos. Criado na França, o formato foi uma forma de facilitar o acesso ao livro. Na década de 1830, o modelo foi importado pelo Brasil, primeiro traduzindo os franceses, depois publicando autores como Teixeira e Sousa, Joaquim Manuel de Macedo, depois José de Alencar e Machado de Assis, chegando a Nelson Rodrigues e Orígenes Lessa.
Mas essa prosa em capítulos, extremamente popular em fins do século XIX, foi gradualmente sendo esquecida. No livro Os romances em folhetins no Brasil (1830 à atualidade), José Ramos Tinhorão faz o primeiro levantamento dos folhetins publicados de 1830 a 1994. Numericamente, pode-se ter uma idéia desse decréscimo: de 1839 a 1900, foram lançados 198 folhetins. De 1950 a 1994, apenas 36.
O jornal literário curitibano Rascunho resolveu recuperar o romance-folhetim. Desde julho, vem publicando, mês a mês, capítulos de O inglês do cemitério dos ingleses, do escritor Fernando Monteiro. Segundo o autor, O inglês "é o fantasma do folhetim literário, voltando para puxar o pé dos leitores ainda interessados na alma". Monteiro já publicou outros livros, e é a primeira vez que escreve por parcelas. "É mais ou menos imprevisível o que pode acontecer com o tecido elástico de um romance-folhetim", diz. No final, pretende fazer como Flaubert com Madame Bovary, ou Machado de Assis com Quincas Borba, e lançar o romance na íntegra, em livro.

1 comentário:

Vítor Leal Barros disse...

o meu comentário tornou-se tão extenso que decidi transformá-lo num post