sexta-feira, março 03, 2006

O Diário de G.H. (4)

As imagens


Há dias encaro esse band-aid com um misto de medo e curiosidade.
Ando na casa inteira num vai-e-vem desmesurado, estou ansiosa e impaciente para as visitas. Receio que elas desconfiem do meu caráter duplo e comecem a me encarar com desconfiança.
É certo que não podia viver assim, prisioneira em meu próprio lar ou como um refém dando refúgio ao bandido. E por que eu acho que isso que está em mim é um inimigo? Como posso temer a mim mesma?
Fui até a gaveta da penteadeira e tirei um espelho desses que aumentam. Posicionei sua face em frente ao machucadinho e, de olhos fechados, puxei o band-aid de uma vez só. Abri os olhos e a feridinha tinha cicatrizado!
Fiquei intragável por alguns dias, procurando no peito um vestígio do machucado que pudesse me revelar os tais olhos.
Vai ver a minha outra teve medo de mim e cimentou internamente as paredes para não ser mais incomodada. Sinto dizer que é uma bobagem, pois agora estou decidida a saber mais dessa criatura e não vou descansar enquanto não encontrá-la novamente.
Decidida a esquecer a obsessão, nem que fosse por um curto período, resolvi sair de casa e ver pessoas. Foi então que ao prender os cabelos num rabo de cavalo a fim de me maquiar, aproximei-me bem do espelho. Senti que por trás dos meus olhos um outro par de olhos me observava, atento. Puxei a cadeira para mais perto, mas eles já não estavam lá. De repente, uma ardência nas costas, virei-me abruptamente.
Estava lá grafado na pele: A I R T E M I S.

1 comentário:

Vítor Leal Barros disse...

Artémis tem uma lado muito cruel...muitas vezes pesa-se o conflito entre o sentido de justiça e a crueldade das penas. Nunca se sabe se dela jorra pureza ou a crueldade do sentido de rectidão quase dogmático... afinal condenou à morte Calisto por se ter apaixonado por Zeus. Não sei ainda quem é G.H. mas tenho a certeza de que não é Artemis. Creio que dela G.H. possui apenas o lado camaleónico...

um beijo