terça-feira, setembro 19, 2006

janelas abertas (2)

J. é um rapazinho de 6 anos. É muito educado e respeitador, gosta de honrar os ensinamentos de sua mãe. Hoje, ao entrar na sala de aula alheio ao tumulto dos colegas que se empurravam na disputa da carteira mais distante da professora, as mãos tremiam-lhe e suavam. Sabia que tinha sido ele. Não tenho culpa, foi um acidente, obrigava-se a crer em si próprio.
J. procurou um lugar vago, caminhou pela sala e em silêncio sentou-se ao lado de L.. Olhou-a na expectativa de algum conforto mas L. permanecia fria e imóvel como o resto da turma. J. levantou de novo os olhos e reparou que A. se aproximava da secretária da professora com uma bola de lona laranja furada na mão. Fui eu, pensava. A. entregou a bola à professora e apontou o braço na direcção de J. gritando convictamente, foi ele!
J. que honra os ensinamentos de sua mãe, baixou a cabeça e olhou fixamente o chão. Sentia medo e culpa. A professora caminhou na sua direcção segurando a bola de lona laranja furada na mão. Apontou-lhe um dedo flácido e amarelo à cabeça e num grito exigiu-lhe uma satisfação.
J. não ousou levantar a cabeça. As pernas tremiam-lhe. Obrigava-se ao silêncio, sabia que devia honrar os ensinamentos de sua mãe. De olhar cativo no chão, sentiu que um lago amarelo lhe nascia pelas pernas e se desenhava redondo no ângulo agudo formado pelas suas botas castanhas.

1 comentário:

Lu disse...

Essa nova série me inquieta, Vítor...