"Mas o preço deste encantamento descontínuo é a extrema dispersão da personalidade e a fragmentação do tempo. Onde achar a unidade do Eu, quando este funde como neve ao sol? Como salvar estes instantes ameaçados de se afundarem para sempre no nada? A esta dupla questão, Proust e Virginia Woolf começaram por dar a mesma resposta. Acontece encontrar-se nesta corrente descontínua «um pouco de tempo em estado puro». O relógio pára, o tempo suspende o seu voo. Na solidão, o ser começa a viver, o seu desejo de existir no instante é finalmente alcançado. (...)
(...) Todavia diferentemente das «impressões felizes» de Proust, dos «momentos de iluminação» de Eliot, estes «momentos de ser», em Virginia Woolf, sólidos, transparentes, não são criadores. Inscrevem-se entre os demais, sem resgate. São «pequenos milagres quotidianos, revelações, fósforos inopinadamente riscados no escuro», mas nunca a grande revelação dramática de Marcel no momento de entrar no salão dos Guermantes, quando vê enfim diante de si o futuro onde se vai inscrever a sua obra. Para a busca proustiana há uma solução, e perante o tempo, uma orientação nova e brusca que decide das relações do personagem com a sua vida tal como a vivera, com a morte que está ali à sua frente. Nada de semelhante em Virginia Woolf. A gota de tempo, por um instante suspensa, cai de novo no telhado da nossa alma. Uma experiência cumpriu-se, uma nova etapa passou. Cada um volta a partir com a pequena sacudidela que se dá a um relógio de pulso parado (...)" (págs. 77 - 79)
Virginia Woolf (Relógio D'Água), Monique Nathan
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